Uma doce reconciliação com a vida e com os outros

Por favor não se esqueçam: A delicadeza e a paciência são mais fortes do que a pressa e a rispidez.

Ando, há uns dias, à procura de uma ideia para um texto mas não tenho conseguido.

Abro o word e vejo uma página imensa e  vazia. Levanto-me. Quero concretizar em palavras, e em pensamentos, a imagem do Gota de mel. Vou beber um café para ver se desperto. Volto a sentar-me no meu lugar. Olho para a página e continua em branco. Tudo me desperta a atenção.

Os gritos das crianças, lá de fora. Os movimentos do quadro que as minhas amigas – a Rita e a Catarina – me ofereceram. Tem cores fortes e coloridas: como África. Salta-me à vista aquela mistura de tons ocre com os traços das zungueiras de filhos às costas e venda à cabeça e das mães, com o pau do funge.

Vou para a janela espreitar uma ideia.

Alcanço um sol tranquilo e radiante de si. Amarelo e tórrido, como mel, ilumina a árvore do tronco longo do páteo da escola. À sua volta sobressai uma tremenda algazarra: os meninos e as meninas da bata branca ora cavaqueiam quietos ora riem imparáveis. Um vento, convicto da sua força, sussurra aos ramos verdes da árvore, sábia de tamanho. O sol encolhe-se e as folhas dançam. O boné do menino voa na  força da ventania. Os sorrisos e as conversas abrandam. A zungueira, que vende a fruta à porta da escola, protege as mangas – que é do sustento – o melhor que pode. Lembrei-me de uma fábula.

Li-a há uns anos nos tais livros que a carrinha da Gulbenkian me trazia. Voltei a encontrá-la num livro, recentemente. É a fábula do vento e do sol. 

O vento e o sol discutiam, um dia, sobre qual dos dois era o mais forte. O vento, para provar que era mais forte que o sol, disse-lhe: “estás a ver aquele homem de casaco? Vou conseguir que ele tire o casaco mais rapidamente que tu”. O Sol escondeu-se e o vento começou a soprar, com toda a sua força, até conseguir a pujança de uma tempestade.  Quanto mais forte soprava mais o homem segurava o casaco. O vento desistiu.

O sol saiu detrás da nuvem, que o protegia, e apareceu ao homem, silencioso e tranquilo. O homem, depois de um tempo, começou a transpirar e tirou o casaco.

O sol disse ao vento que a delicadeza e a persistência são mais fortes do que a pressa e a rispidez.

Dizem que as fábulas são ingénuas e irreais; mas se as entendermos são muitas as verdades que saem dali.

Por favor não se esqueçam que a doçura do ânimo, e da calma, podem fazer com se tire o casaco mais depressa do que o acre da resistência, e da arrogância.

Aconteça o que acontecer vamos tentar agradar. Disso não me quero esquecer. Por isso o escrevi, aqui (para nós e para mim).

Cláudia Rodrigues Coutinho

Luanda, 14 fevereiro de 2019