O ar vigoroso da vida de África e o alento quente da Namíbia
Um dia tive uma casa em Luanda, a capital e província nuclear de Angola, que se estende a partir da sua extensa costa.
Vivi em Angola, plena África Central Ocidental, a sul do equador. O seu território estende-se por uma grande variedade de climas, vegetação e relevo e a sua dimensão é imponente, tal como os países que conheci à volta, durante a minha aventura de 4 anos, a existir neste continente.
Desde o regresso a Portugal, de vez em quando, quando estou sozinha, vislumbro aquele infinito de tempo que se suspende pelo horizonte e parto para mais uma expedição que me transporta para as coisas mais bonitas que já vi até hoje..
A vastidão desta estrada longa e inexplicável empurra, para dentro de mim, a paz do vazio, a liberdade aos saltos, veemente, os sons de uma cerimónia da vida limpa e espaçosa.
Descora para dentro de mim: o traçado de um tudo que estava certo; em que em harmonia com a minha respiração e poros, e encarando de frente, o horizonte, sinto ser tão feliz.
A principal particularidade das paisagens de África, e da vida que nela se (re)existe, é o ar vigoroso da vida e o alento quente e imensamente livre do tempo. Quando por lá se passa a impressão é de se viver num instante interrompido. O ar ali é vivo e tem uma força cálida que em tudo o que toca cintila e brilha, criando confiança e leveza no coração.
Percorria a Namíbia nas suas longas estradas sentindo no seu sopro quente: uma paisagem solitária que no silêncio cerzia nuvens inquietas e gordas, num céu azul-pálido e aberto; à minha volta, a terra, nem farta, nem luxuriante, de cores secas, quentes, as árvores altas de folhas leves, dispersas – com uma estrutura diferente das nossas.
A viver o meu sonho africano e no percurso de uma viagem de redescoberta esta preciosidade de África, que é a Namíbia, guiou-me a uma experiência única, onde ali cada cultura vive o agora de maneira única e sua, e onde assertamos o que são sorrisos limpos.
Das duas vezes que fomos, partimos, de avião, de Luanda para Windhoek, capital da Namíbia, e lá alugámos um carro.
Em Windhoek senti-me segura enquanto confirmava uma cidade limpa, organizada, com edifícios históricos a marcar a presença e legado alemão e o fim de um estilo de vida que desapareceu para sempre, de um continente colonizado – mas que ainda se recorda também nos seus restaurantes e língua alemã.
Logo bem cedo, com a geleira na mala do carro partimos rumo ao Etosha National Park, no noroeste da Namíbia, uma área conhecida pela sua vida selvagem.
Fomos lanchando nos parques de merendes disponíveis nas extensas estradas e chegamos ansiosos aquela que foi a nossa primeira experiência de vida selvagem.
Percorremos os trilhos do parque no nosso carro e vimos alguns animais selvagens como a hiena, elefantes, leões, avestruzes, zebras, girafas, espécies raras de aves lindas, kudus, impalas, springbok, entre outros.
A vegetação vai variando de uma mata densa a planícies e a sensação de aventura pelo contacto direto com a vida selvagem e a natureza é deslumbrante.
Após uma noite bem dormida, em pleno toque com a mais pura das essências, num dos muitos lodges confortáveis e com culinária maravilhosa, disponíveis neste país, partimos para o próximo destino: o porto principal, para o sudoeste alemão da África, Swakopmund, muitas vezes descrita como sendo mais alemã do que a própria Alemanha.
Swakopmund é a capital da região da Costa dos Esqueletos e tem tudo para nos fazer sentir bem, numa simbiose única de influências alemãs e namibianas.
O cheiro tão diferente daquela brisa fresca do mar e a simetria dos edifícios da época colonial alemã tornam este destino carismático e único, numa coexistência harmoniosa, Alemã e Namibiana, concertando valores europeus e da Namíbia.
Fizemos um passeio a Sandwish Harbour, com um cruzeiro marítimo ao encontro de focas, golfinhos e pelicanos e no final comemos ostras frescas e champagne Sul Africano.
Ainda tivemos a sorte de vaguear pelas Dunas do Deserto do Namibe num encontro único e magnífico com o Oceano Atlântico.
William Blake escreveu,num dos seus poemas: “ To see a World in a Grain of Sand And a Heaven in a Wild Flower, Hold Infinity in the palm of your hand, And Eternity in an hour (…)“.
Inspirando-me nestas palavras, de mensagem, dirigimos o olhar um mundo num grão de areia e o paraíso numa flor selvagem, segurando o infinito pela palma da mão e testando a paz de espírito num instante.
Serenidade continua que é sobejamente iluminada pelos sorrisos das crianças de África.
Crianças que nos sussurram, bem de leve ao ouvido, nos seus sorrisos e olhos brilhantes, a coragem, a resiliência, o entusiasmo, a solidariedade e a gratidão.
Crianças que ultrapassam e inventam, todos os dias, mais que cada um de nós; e resistem, a sorrir, a tantas adversidades e desafios.
No meio de uma Namíbia de grandezas, imponente em natureza, areia do deserto, vida selvagem e aventuras, dou por mim a viajar, sempre que posso – aos olhos desta África das crianças dos olhos brilhantes e dos sorrisos lúcidos ou das pessoas que tomam conta umas das outras, sem troca de prémios – a contemplar o que não é visível, na paz de uma qualquer estrada infinita..
Cláudia Rodrigues Coutinho
Santarém, 19 de agosto de 2021
* Poema de William Blake: “ To see a World in a Grain of Sand And a Heaven in a Wild Flower, Hold Infinity in the palm of your hand, And Eternity in an hour. „(…)